Publicação: 12-05-2010 13:21 | Última actualização: 12-05-2010 13:21
A economia portuguesa terá crescido 1% no primeiro trimestre deste ano, por comparação com o último trimestre de 2009. Isto é importante porque dá um sinal animador aos agentes económicos. Se houvesse de novo um trimestre negativo (PIB no 4º trimestre foi menos 0,2%), Portugal entraria de novo em recessão técnica. Pelo contrário, apresenta o maior crescimento de toda a Europa. Será milagre da visita do Papa?
Luís Ferreira Lopes, Editor de Economia
Se fizermos a comparação com o primeiro trimestre de 2009, o PIB até cresceu 1,7 por cento, mas é preciso lembrar que há um ano a economia encolhia 3,7% devido aos efeitos da tremenda crise financeira mundial, o que nos arrastou para a recessão, tal como à Europa em geral. Portanto, é o próprio INE a chamar a atenção para o tal "efeito de base" nesta comparação homóloga e também para a inclusão das despesas de consumo final das administrações públicas nestas estatísticas.
O primeiro-ministro já reagiu atacando os "arautos da desgraça" e fez questão de clamar que Portugal é "o campeão do crescimento europeu", procurando captar alguns méritos para o governo face a tão inesperada e importante notícia. Obviamente, é preciso prudência e serenidade a olhar para estes números, assim como foi necessário ter nervos de aço perante o ataque dos especuladores na recente crise dos mercados, porque há o risco deste número excelente ser apenas um "fogacho" de Primavera.
Há agora duas perguntas a fazer sobre esta estimativa rápida do INE:
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Este crescimento de 1% é sustentável nos próximos trimestres?
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Como se explica este comportamento surpreendente do PIB?
Este crescimento de 1% é sustentável nos próximos trimestres?
Como se explica este comportamento surpreendente do PIB?
- A procura interna aguentou a economia à tona de água entre Janeiro e Março porque a inflação negativa permitiu a quem manteve emprego e salário um aumento do poder de compra (o que também aconteceu em 2009) e muitas pessoas aproveitaram os saldos, numa euforia consumista nos shoppings que contrariava, de alguma forma, a ideia de uma crise grave num país tão endividado.
- Em segundo lugar, houve melhoria das exportações, especialmente em Março.
- Por fim, é preciso analisar melhor o contributo da despesa corrente do Estado ou, mais propriamente, do consumo público para o crescimento económico no primeiro trimestre: se o Estado continuar a gastar bastante como se a dívida pública e o défice não fossem tão altos (e mesmo adiando o investimento público), isso até pode ajudar a economia a manter-se à tona de água, mas ficará tudo complicado no futuro, como qualquer dona de casa percebe. Ou seja, não é sustentável.
2) É possível manter a pedalada, ou seja, haver crescimentos idênticos nos próximos trimestres? Esperamos todos que sim, mas é preciso ter em conta três factores:
- Se houver cortes na despesa pública e no consumo / gastos do Estado, isso terá efeitos na economia; logo, o contributo do Estado poderá ser menor, porque é insustentável não cortar a sério do lado da despesa como está, aliás, a fazer a vizinha Espanha.
- Se houver novas medidas de austeridade, com aumento do IVA ou do imposto sobre os combustíveis (para também reduzir as importações), e se houver cortes em subsídios de férias ou Natal, o efeito será a diminuição da procura interna porque os consumidores e empresas sabem fazer contas e tenderão a cortar nos gastos.
- Se a zona euro continuar estagnada, o mesmo é dizer ter crescimentos fracos de apenas 0,2% nos próximos trimestres, isso não é animador para as exportações portuguesas. Se a Europa crescer bem mais, então aí sim, o nosso crescimento será feito pelo lado mais saudável que é o das exportações, de preferência de bens transaccionáveis.
Em conclusão: são sinais animadores que aliviarão, eventualmente, a pressão dos mercados financeiros sobre a dívida pública e externa, mas não serão sustentáveis se não houver cortes drásticos da despesa do Estado nos próximos tempos, como esperam os parceiros da União a 27 e a própria Comissão Europeia.
É cedo para falar em retoma e para deitar foguetes antes da festa, mas há hoje, felizmente, mais motivos para sorrir. E para quem está farto de dar más notícias, é bom dar notícias animadoras, para variar...
Nota final: gostaria de acreditar em milagres e, nesse caso, o PIB crescer 1% em cadeia seria um milagre. Em todo o caso, Sócrates tem boas razões para ir acender uma velinha a Fátima, para aproveitar o feriado que concedeu ao povo, antes de aumentar os impostos.
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