Face oculta, os nomes

31 OUT 09
Operação Face Oculta

A corrupção e o tráfico de influências junto do Governo e das empresas públicas. Leia tudo o que o MP diz sobre a 'Operação Face Oculta'
 


Manuel Godinho, presidente da empresa de tratamentos de resíduos envolvida no processo 'Face Oculta', beneficiou de uma extensa rede de gestores ligados ao PS para conseguir os melhores negócios em várias empresas participadas pelo Estado.

O DIAP (Departamento de Investigação e Acção Penal) do Baixo Vouga e a Polícia Judiciária (PJ) de Aveiro entendem ter provas de que Armando Vara, vice-presidente do Banco Comercial Português (BCP), juntamente com os gestores Lopes Barreira (Consulgal), Paiva Nunes (EDP Imobiliária), Paulo Costa (Galp) e António Contradanças (Empoderf), Carlos Vasconcellos (Refer), José Penedos (presidente da Rede Eléctrica Nacional) e Paulo Penedos (assessor da Comissão Executiva da PT) ajudaram de forma ilegítima Manuel Godinho e o seu grupo O2 a ganharem concursos públicos naquelas e noutras empresas.

A PJ entende que Armando Vara, Paulo Penedos, Paiva Nunes, Paulo Costa e Carlos Vasconcellos receberam avultadas contrapartidas financeiras e patrimoniais para 'abrirem as portas' daquelas empresas participadas pelo Estado às empresas de Manuel Godinho.

Vara e Lopes Barreira: figuras centrais

Armando Vara e Lopes Barreira são nomes centrais dessa «rede tentacular», segundo as palavras do DIAP do Baixo Vouga. Amigo de Vara e um dos fundadores da Fundação para a Prevenção e Segurança (polémica entidade que Vara criou enquanto secretário de Estado de António Guterres), Lopes Barreira tem um passado de ligação ao Partido Socialista, 'mexendo-se' muito bem nos corredores do poder. Em 1999 foi acusado pelo general Garcia dos Santos, então presidente da JAE (Junta Autónoma de Estradas), de o ter tentado pressionar para contratar militantes socialistas para os quadros daquela empresa pública. Anos antes, a Consulgal, de Lopes Barreira, tinha estado 'debaixo de fogo' por ter sido a autora do projecto de renovação da Linha do Norte – obra que, devido a vários erros de vários projectistas, teve um desvio financeiro de mais de 200 milhões de euros.

No processo 'Face Oculta', Lopes Barreira é dado como membro de uma «rede tentacular», que, «a troco de vantagens patrimoniais e/ou não patrimoniais» terá exercido a «sua influência junto de titulares de cargos governativos e políticos, titulares de cargos de direcção com capacidade de decisão ou com acesso a informação privilegiada, no sentido de favorecerem» as empresas de Manuel Godinho.

Contactos com governantes

Um mês depois, Lopes Barreira manifestou-se disponível a Godinho para falar com Jorge Coelho, presidente da Mota-Engil e ex-ministro de António Guterres, no sentido de lhe arranjarem trabalho para as suas empresas. Só em 2008, o grupo O2 facturou mais de 50 milhões de euros, quando no ano anterior não tinham ido além dos 24 milhões de euros.

Além de Coelho, Lopes Barreira afirmou a Godinho que possuía boas relações com o então ministro das Obras Públicas, Mário Lino (peça fundamental para desbloquear o conflito que a REFER tinha com Godinho) e com João Mira Gomes, secretário da Estado da Defesa. O empresário disponibilizou-se para falar com Gomes, seu amigo pessoal, para «espoletar o favorecimento do universo empresarial» do grupo O2 junto das empresas tuteladas pelo Ministério da Defesa, nomeadamente com os Estaleiros Navais de Viana do Castelo – empresa com a qual Godinho se queixava não ter relações comerciais.

Vara apresenta a Godinho administrador da EDP

Armando Vara, por seu lado, apresentou a Godinho um administrador da EDP Imobiliário, chamado Paiva Nunes – tendo alegadamente solicitado cerca de 10 mil euros em numerário como contrapartida que lhe foram entregues no seu gabinete do BCP, na Av. José Malhoa, em Lisboa. Paiva Nunes, segundo a PJ de Aveiro, terá favorecido as empresas de Godinho em diversos concursos lançados por aquela empresa. Paiva Nunes chegou a pedir a Manuel Godinho que lhe indicasse três empresas para uma consulta ao mercado que o grupo EDP iria realizar, ao que o líder da O2 indicou duas sociedades por si lideradas e um empreiteiro da sua confiança. O objectivo era claro: o grupo de Godinho ganharia o concurso.

Através do gestor da EDP (que chegou a ser candidato do PS à Câmara de Sintra), Godinho 'chegou' a Paulo Costa, director de Relações Institucionais da Galp. Costa, que é dado por Paulo Penedos como «amigo de Armando Vara», ligou a Manuel  Godinho no dia 3 de Junho de 2009 e discutiu com o gestor da O2 «pormenores capazes de possibilitar o favorecimento» da FRACON – Construção e Reparação Naval, Lda – uma das empresas do grupo O2.

Paiva Nunes e Paulo Costa receberam de Manuel Godinho dois veículos topo gama, tendo o primeiro recebido um Mercedes SL 500 (avaliado em 161 mil euros) e o quadro superior da Galp um Mercedes CL 65 (avaliado em mais de 280 mil euros). A PJ de Aveiro entende que os dois veículos são uma contrapartida pelas decisões dos dois gestores.

Gestor do PS apresenta 'colega' a Godinho

Paulo Costa apresentou a Godinho mais um gestor ligado ao PS: José António Contradanças. Ex-dirigente do PS e ex-administrador do Porto de Sines no tempo de Jorge Coelho como ministro das Obras Públicas, Contradanças é agora administrador de uma empresa do grupo EMPORDEF – holding estatal controlada pelo Estado através do Ministério da Defesa.

Contradanças ligou a Manuel Godinho no dia 5 de Junho de 2009, «dando-lhe conta que Paulo Costa lhe havia transmitido que estaria interessado em ser favorecido nos concursos e nas consultas públicas» na área dos resíduos industriais lançados pela empresa IDD – Indústria de Desmilitarização e Defesa, SA., lê-se no mandado de busca a que o SOL teve acesso.

A principal fonte na REFER

Carlos Vasconcellos, ex-administrador do grupo Refer, é mais um gestor público que alegadamente terá sido subornado por Manuel Godinho. Segundo a PJ, Vasconcelos terá recebido de Godinho cerca de 2.500 euros em numerário para que lhe «continuasse a fornecer informação privilegiada sobre o posicionamento, o pensar e o sentir da administração da Refer», segundo se pode ler no mandado das buscas realizadas na passada quarta-feira. Vasconcellos foi uma peça importante na tentativa de afastamento da administração liderada por Luís Pardal. O ex-administrador do grupo REFER, hoje simples funcionário, tinha sido afastado por Pardal depois de a empresa ter descoberto, através de um inquérito interno, o seu envolvimento nos alegados favorecimentos às empresas de Godinho nas adjudicações da gestora da rede ferroviária.


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